9 de abril de 2008

Sobre meninos e lobos

A ânsia das autoridades brasileiras em combater a pedofilia parece um daqueles estandartes dos grupos que lutam pela moral e pelos bons costumes. Daqueles que saem atirando (ou jogando pedras) primeiro para depois verificar se existe culpa.

Pedofilia é uma doença, uma doença horrível, e um problema internacional. Não se trata de uma característica intrínseca no povo brasileiro. Aliás, em povo nenhum. Não dá para tratar apenas como um problema localizado.

Mas, enfim, por que eu estou falando tudo isso? Porque, mais uma vez, o governo decidiu culpar o Google pelo que as pessoas fazem. Como se a empresa fosse conivente com o comportamento de seus usuários. Plataformas abertas em geral, e incluo aí o Linux, não costumam pedir antecedentes criminais e ficha médica aos seus colaboradores/usuários/simpatizantes. Aliás, não sei nem se as empresas "normais" fazem isso com seus futuros funcionários.

Seguindo a lógica do governo, se uma companhia (digamos, a GM, a Petrobrás, qualquer uma) possuir em seu quadro de funcionários um pedófilo, ela deveria ser chamada a depor na CPI por viabilizar (no caso, pagando o salário que pode ser usado pelo tal funcionário da forma que ele quiser, inclusive comprando filmes e fotos de abuso de criancinhas na internet) e corrorobar com tal ação criminosa. E não é a primeira vez que esse tipo de "lógica" das autoridades me assusta.

Eu já dei banho nas minhas sobrinhas. Sou pedófila? Conheço um cara que filmou o parto do segundo filho da irmã. Ele é pedófilo? Nos Estados Unidos, já virou crime uma criança tocar em outra. Crianças estão sendo acusadas de assédio sexual. Lembra do quase inocente "mostra o seu que eu mostro o meu"?? Nossa... Veremos centenas de pequenos indo para a prisão por causa de saudáveis brincadeiras de médico? Lá em casa, andar sem roupa sempre foi muito natural, o que foi de uma ajuda e tanto nas duas vezes em que quebrei o pé e quando tive de operar. Imagina depender dos outros pra tudo, mas não poder ficar sem roupa? Como você vai ao banheiro? Como toma banho? Como faz o curativo, como limpa os ferimentos? Nossa, coitados dos médicos e enfermeiras de escolas. O futuro visto nos filmes de ficção científica, aquele em que não existe afeto e as pessoas não podem se tocar, parece muito próximo. E isso é triste.

A questão é que tudo deve ser visto com muito cuidado. A aprovação da quebra de sigilo de álbuns protegidos no Orkut, agora pela manhã, mesmo que por enquanto afete um universo pequeno de usuários do serviço (que, provavelmente, são pessoas que já estão sendo investigadas pelas autoridades), abre um precedente muito perigoso.

O de que o governo pode usar qualquer desculpa para entrar na sua casa e na sua vida online e ter controle sobre tudo o que você faz, tenha você antecedentes criminais ou não. Descobrir se você usa lingerie de renda ou com desenhos para traçar seu "perfil psicológico" e determinar a probabilidade de você virar um criminoso. Agora é a pedofilia, já foram casos de calúnia, o que virá depois?

Os álbuns fechados, bênção criada para proteger a privacidade dos usuários online, viram agora indícios, evidências. Seria importante o governo aprender que esse tipo de recurso foi criado justamente para proteger as pessoas de possíveis criminosos, de invejosos e de ex-namorados(as) capazes de tudo para infernizar a nova vida feliz do ex, e não o contrário.

E mais uma coisa: podem tirar todos os sites e comunidades do ar. Isso não vai extinguir o crime. Pedófilos, chantagistas, etc, sempre arranjarão um meio de atingir seus objetivos. E o progresso, definitivamente, não é culpado por isso.

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